sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O que há de tão importante nas raças dos cães


Há pouco tempo, eu estava em um parque quando ouvi dois proprietários de cães conversando sobre as diferenças raciais de seus pets, até que em um determinado momento, um deles falou que jamais teria Pit Bulls ou Rottweilers, por serem animais naturalmente agressivos. Tenho conhecidos que afirmam que nunca deixariam seus filhos pequenos perto dos Rottweilers de casa, pois é uma raça imprevisível. Nos últimos tempos, algumas pessoas têm me perguntado sobre a influência da raça no comportamento dos cães, em especial na agressividade. Vou tentar extinguir esse mito que existe na cabeça de muitos.

Particularmente, acho esse um assunto muito interessante, pois é possível perceber como as pessoas focam no que menos importa na relação entre o humano e o cão – a raça, ao invés de se preocupar com o animal em si. Não seria errado se eu afirmasse que, dentre os seres humanos, a raça negra ou a branca é mais inteligente? Da mesma forma, eu não estaria enganado caso afirmasse que os orientais ou os índios são mais agressivos? A mesma linha de pensamento também pode ser aplicada às raças dos cães.

Casacos de pele

Certa vez, ouvi um grande terapeuta canino comparar as raças com roupas para explicar os mitos sobre a influência racial no comportamento dos cães – particularmente, gosto muito dessa analogia. Ele dizia que as raças são como se fossem roupas que os cachorros usam. Por debaixo desse “casaco de pele” está o que realmente importa – o animal. Portanto, todos esses animais que vestem diferentes “roupas” são, no fundo, da mesma espécie – cães.

Geralmente, as pessoas costumam olhar para os cachorros lembrando-se apenas de sua raça: “essa é a Meg, minha Lhasa apso” ou “esse é o Max, meu Pastor Alemão”, e, a partir dessa individualização, começam a justificar o comportamento ou questões comportamentais de seus animais. Elas se esquecem que, no fundo, o estudo da psicologia canina é único, não havendo nenhuma diferenciação para cada raça.

Portanto, não concordo quando afirmam que Rottweilers, Pit Bulls e Dobermans são animais agressivos devido à raça – já fui atacado por cães de pequeno porte, mas nunca por de raças maiores ou “agressivas”. Eu os enxergo como cães e sei que, naturalmente, esses animais não são agressivos. E exatamente por serem cachorros, sei que necessitam de atividade física frequente e de um bando (mesmo que seja só de humanos) que tenha regras bem definidas para que vivam harmoniosamente conosco.

Em nenhum momento foi preciso diferenciar ou abrir exceções para essa ou aquela raça. Acredito que, de forma geral, quando há agressividade – ou qualquer outra questão comportamental, existe também alguma instabilidade na criação do animal – a culpa não é do “casaco de pele” que ele veste, mas alguma coisa de errado o dono está fazendo ou deixando de fazer pelo animal.

O porquê das raças

As raças foram desenvolvidas para melhorar determinadas características que seriam úteis para algumas atividades. Originalmente, os Buldogues Ingleses foram criados para lutar contra touros, exigindo que o animal fosse robusto e possuísse dobras sobre o focinho para permitir o escorrimento do sangue do boi sem afogar o cão. Já os Basset Hounds foram desenvolvidos para farejar, sendo mais interessante que tivesse pernas curtas para ficar com o focinho mais próximo do chão e que a cavidade nasal fosse mais comprida para ter maior superfície de contato com as partículas de odor. Não é por isso que vemos hoje em dia Buldogues atacando desesperadamente bois ou Basset Hounds que só querem saber de caçar.

Assim como ocorre conosco, a raça não diz como deve ser o comportamento do animal. Infelizmente, esse mito sobre as raças agressivas ainda existe e está muito arraigado na nossa cultura. Muitos proprietários inescrupulosos ou descuidados criam seus animais de forma inadequada, fazendo com que determinadas raças ganhem, desmerecidamente, o título de agressivas.

Dr. Marcel Pereira É médico veterinário e mestre em medicina veterinária pela Faculdade de Mecina Veterinária e Zootecnia / USP. Atualmente trabalha como terapeuta canino, reabilitando cães com problemas comportamentais.

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