Pelo quarto dia seguido, milhares de egípcios saíram às ruas das principais cidades do país para protestar contra o governo de Hosny Mubarak. Na capital, Cairo, e em Suez e Alexandria os manifestantes enfrentaram bombas de gás, cassetetes e canhões de água. Havia mais gente que na já histórica manifestação de terça-feira (25). A repressão policial também foi maior.
O toque de recolher decretado para o período da noite foi largamente ignorado. A sede do partido do governo, o Partido Nacional Democrático (NDP), foi incendiada, bem como vários carros da polícia. O ministério de Negócios Estrangeiros também foi atacado. Blindados do Exército foram mandados para as ruas. Alguns soldados foram vistos cumprimentando os manifestantes que deveriam reprimir.
As passeatas começaram logo depois da oração semanal dos muçulmanos. Exatamente como proposto nas milhares de mensagens que circularam pela internet nos últimos dias. Os protestos também venceram as barreiras religiosas. Cristãos e muçulmanos marcharam lado a lado, durante todo o dia.
Jornalistas de vários veículos denunciaram que foram espancados pelas forças de segurança do governo. A rede de TV Al Jazeera relatou o momento em que policiais batiam na porta do escritório da empresa, enquanto imagens dos distúrbios, captadas da janela, eram mostrados ao vivo. Não houve interrupção do sinal da emissora.
Nos primeiros minutos da sexta-feira (28), a internet parou de funcionar. O bloqueio eletrônico imposto pelo governo de Mubarak também atingiu a troca de mensagens instantâneas por celular (SMS). Gráficos disponibilizados na rede pela empresa de monitoramento Renesys mostram que, às 00h34, hora local, praticamente todas as rotas dos provedores egípcios deixaram de ter tráfego. A empresa Vodaphone confirmou ter recebido instruções do governo para suspender parcialmente os serviços.
De acordo com a professora de comunicação da Universidade do Cairo Howayda Mostafa, citada pela Voz da America, sítios de relacionamento como Facebook e Twitter têm tido um papel preponderante na convocação das manifestações. Segundo ela, o alcance das mensagens fez com que, pela primeira vez, jovens de várias camadas sociais se envolvessem em um movimento político dessa dimensão. Cerca de 3,4 milhões de egípcios têm conta no Facebook. É o país árabe mais presente no sítio de relacionamento.
Apoio aos manifestantes
O corte nas comunicações e a repressão aos manifestantes geraram um pronunciamento da secretária de Estado norte-ameriana, Hillary Clinton. Aliados de Mubarak, os Estados Unidos disseram-se “profundamente preocupados com a situação”. Hillary pediu o reestabelecimento da internet e dos serviços de telefonia, a permissão de protestos pacíficos e respeito aos direitos humanos.
Durante a madrugada, líderes da oposição ligados à Fraternidade Muçulmana foram presos. Até então oficialmente afastados dos protestos, parte dos líderes resolveu aderir. Mohamed El Baradei, vencedor do Prêmio Nobel da Paz pelo trabalho como inspetor nuclear das Nações Unidas, foi detido, mas liberado em seguida. Ele chegou dia 28 ao Egito, vindo da Áustria, dizendo-se pronto para “liderar a transição” no país.
Resistência do governo
Para o especialista em Relações Internacionais Celso Gusse, do Instituto Superior de Relações Internacionais de Moçambique, o presidente egípcio tem mais condições que o ex-presidente da Tunísia, Zine al-Abidine Ben Ali, de resistir à pressão popular. “No Egito, as instituições - principalmente de defesa e segurança - estão mais comprometidos com o presidente da República do que na Tunísia”, afirmou Gusse. “Não diria que é impossível. Mas acho improvável que o presidente Mubarak abra mão do poder.”
Zine Ben Ali caiu depois de um mês de grandes manifestações populares, que começaram no interior da Tunísia e só depois chegaram à capital Túnis. A resposta da polícia foi violenta e deixou mais de 60 mortos, o que só agravou o quadro para o partido no poder.
Para o professor Gusse, outra diferença entre Tunísia e Egito está no perfil da população dos dois países. “A estrutura de sociedade no Egito é bem diferente da vista na Tunísia, que tem índices de alfabetização e escolaridade mais altos. A classe média também é mais forte que em relação ao Egito”.
“Os regimes árabes têm que perceber a necessidade de maior abertura às liberdades políticas e mudanças sociais”, afirma Celso Gusse. “Mas a forma como cada um desses países vai reagir é diferente.”
Fonte: Alternativa OnLine
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