terça-feira, 9 de abril de 2013

A caridade substituindo o egoísmo


Desde que dois homens estejam juntos, contraem, por isto mesmo, deveres recíprocos; se quiserem viver em paz, serão obrigados a se fazerem mútuas concessões.

Esses deveres aumentam com o número dos indivíduos; as aglomerações formam um todo coletivo que também tem suas obrigações respectivas.

Temos, pois, além das relações de indivíduo a indivíduo, as de cidade a cidade, de país a país.

Essas relações podem ter dois móveis que são a negação um do outro: o egoísmo e a caridade, pois que há também egoísmo nacional.

Com o egoísmo, prevalece o interesse pessoal, cada um vive para si, vendo no semelhante apenas um antagonista, um rival que pode concorrer conosco, que podemos explorar ou que pode nos explorar; aquele que fará o possível para chegar antes de nós: a vitória é do mais esperto e a sociedade - coisa triste de dizer - muitas vezes consagra essa vitória.

Disso resulta uma sociedade dividida em duas classes principais: os exploradores e os explorados.

Temos aí um antagonismo perpétuo, que faz da vida um tormento, um verdadeiro inferno.

Substituí o egoísmo pela caridade e tudo se modificará; ninguém procurará fazer o mal ao seu vizinho; os ódios e os ciúmes se extinguirão por falta de combustível, e os homens viverão em paz, ajudando-se mutuamente em vez de se dilacerarem.

Se a caridade substituir o egoísmo, todas as instituições sociais serão fundadas sobre o princípio da solidariedade e da reciprocidade; o forte protegerá o fraco, em vez de o explorar.

É um belo sonho, dirão; infelizmente não passa de um sonho; o homem é egoísta por natureza, por necessidade e o será sempre.

Se assim fosse, o que seria muito triste, é o caso de se perguntar com que objetivo o Cristo veio até nós pregar a caridade aos homens? Equivaleria a pregar aos animais.

Examinemos, contudo, a questão: Há progresso do selvagem ao homem civilizado? Não se procura, diariamente, abrandar os costumes dos selvagens? Mas, com que finalidade, se o homem é incorrigível?

Estranha bizarrice! Espera-se corrigir selvagens e pensa-se que o homem civilizado não pode melhorar-se!

Se o homem civilizado tivesse a pretensão de haver atingido o último limite do progresso acessível à espécie humana, bastaria comparar os costumes, o caráter, a legislação, as instituições sociais de hoje com as de outrora.

E, no entanto, os homens de outrora, também eles, acreditavam ter alcançado o último degrau.

Que teria respondido um grão-senhor do tempo de Luís XIV se lhe tivessem dito que poderia dispor de uma ordem de coisas melhor, mais equitativa, mais humana do que a então vigente?

Que esse regime mais equitativo seria a abolição dos privilégios de castas e a igualdade do grande e do pequeno diante da lei?

O audacioso que assim falasse talvez pagasse caro sua temeridade.

Disso concluímos que o homem é eminentemente perfectível, e que os mais adiantados hoje poderão parecer tão atrasados dentro de alguns séculos quanto o são os da Idade Média em relação a nós.

Negar o fato seria negar o progresso, que é uma lei da natureza.

Pensemos nisso.


Redação do Momento Espírita, com base em trecho da
obra Viagem espírita em 1862 e outras viagens, de
Allan Kardec, ed. Feb.
Em 28.3.2013.

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